sexta-feira, 22 de abril de 2011


Cotidiano ou Numa tarde qualquer.

Antes.

Hoje juntei as últimas lágrimas dentro de um pote de margarina e as guardei bem no fundo da geladeira. Ontem eu faria de forma diferente, talvez as pusesse numa forma e enfiasse no congelador pra quem sabe por na bebida. Demasiadamente trágico. Optei então pelo pote da margarina, aquele bem comum, nem muito sujo nem muito limpo, chorei horas copiosas ali dentro, tampei o pranto, uma nova receita pra ser ensinada nesses programas matinais onde se faz comida e ri-se à toa da vida.

Depois.

Deslizei o dedo suave sobre o rejunte dos azulejos da cozinha sem tentativa de nada, sem fuga alguma, deslizei os dedos e só. O prazer vinha da sensação dos caminhos traçados por mim-dedo e o rejunte que juntava os lados opostos e iguais dos ladrilhos na parede. Parei. Sentei no chão e observei calmamente as coisas se esvaírem uma a uma, analisei os armários, panelas, janelas, garfos, facas, tudo, cada coisa tal qual eram. Vagas, não me diziam nada.

Por fim.

Com o dedo enfiado no olho fiquei fresteando a porta pra ver se ela entrava por ali. Só ouvia o ruído insuportável daquele cachorro podre que fica lá no pátio.
- Abre a porta.
- Não posso meu olho ta doendo.
- Doendo, porque você não quer ver. É isso, você não quer. Abre!
- Eu to aqui. Abre os olhos.
Meu dedo, cada vez mais enfiado no olho, com toda a força que tinha consegui arrancá-la de dentro de mim e jogar no chão. Agora sim eu a via, única, impiedosa, aplastada junto ao meu pé pedindo loucamente pra voltar pra dentro.
Neguei, neguei até o fim. Jurei. Enlouqueci, desnorteei, a raiva me subia pelos pêlos e gritava por todos meus poros. Chutei-a, cuspi, esmaguei-a, mordi, separei os pedaços um a um nos cantos da cozinha.
E só no fim percebi que estava cego, mordendo a mim mesmo, roendo-me os pedaços, devagar, pisando em algo que não existia a não ser na minha ilusão.
Com o resto dela nas mãos saboreei cada pedacinho devagar. E ali esperei dias que ela voltasse, renascesse.
O tempo passou.
A noite chegou.
O dia morreu.
Continuamos todos cegos.
Cadê você?
Quem é você?
Dê-me seus olhos pra que eu possa enxergar.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Tem fim, sim!


Talvez se ele não disse ninguém viesse, a saber, o que lhe passava na cabeça, mas tinha obrigação de acontecer.... Eu que achava tão bonito isso de ser abstrato... Sou chamado pra realidade e seu abismo invisível o dia a dia.
Nada haver com rotina e suas conseqüências nas pessoas, e sim, a vida e seu diário, seus preâmbulos, abismos, alegrias, chateações, uma guerra constante, não com os outros, mas com você, como se manter calmo no meio do caos. Ninguém disse que ganhando a corrida dentre milhões de espermatozóides ia ser fácil depois, mas também ninguém avisou antes que ia ser tão difícil.
É saboroso, de certa forma, mas em suma é um emaranhado de sensações primárias....
E tem fim? Sim, o sabido é que tem fim.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Sobre o TEMPO


Chove por aqui, a pouco fazia calor. Aqui não neva, mas aqui às vezes gela.
Variações de um mesmo tempo, sempre ocorrem em tempos diferentes.

- Espera!
- Tô esperando.
- Então diz. Em que tempo estamos agora, qual o nosso tempo?
- Ah, não sei. Você sempre vem com essas perguntas difíceis.
- Difíceis nada. Você é que nunca quer saber sobre o tempo.

Faz calor por aqui, a pouco chovia. Aqui neva, mas ás vezes faz calor, pouco, mas faz.
O tempo não varia, sempre ocorre tudo no mesmo tempo, presente.

-To esperando!
-Espera!
-Diz então: ainda nos resta algum tempo?
-Ah, não sei. Você e suas perguntas difíceis.
-Novamente fugindo do nosso tempo.
Chover, fazer sol, nevar, variações num mesmo ciclo. Queria saber em que ciclo nós estamos por isso pergunto:

Tem nevado, feito calor, frio, tem chovido por aí?

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Considerações I


Você se conhece?
Você se assusta quando vê sua foto?
Quando sua imagem reflete no espelho e não parece você e sim algo desconhecido...
Talvez aí esteja a resposta, você pode nunca se conhecer e você muitas vezes vai se desconhecer e se redescobrir e variar em si com todas suas possíveis e inimagináveis variações.
Reveja algumas fotos antigas, perceba sua boca, seus olhos, alguns pelos... Tudo diferente, divina novidade nos seus novos olhos.
E então vai chegar um dia em que se reconhecer será assumir que está perdido, mas tem uma pequena noção de alguns traços seus, de alguma pequena forma, de uns traços de personalidade.
E será tão bom regredir dentro de si se re-buscar, se desconhecer passa a ser a coisa mais maravilhosa...
Com o tempo as certezas tomam o caminho do vento e somente resta a dúvida, a gostosa dúvida eterna de não se saber, de se sentir rascunho.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

O MAR MAIS LONGE QUE EU VEJO




Pra ler ao som de Barcarola, de Antonio Sanguinetti


Queria que eles mensurassem as ondas do mar batendo nas pedras nessa linda manhã de primavera... Eles não veriam, eles nada veem, dormem.
A espuma branca que se forma ao bater contra as pedras, à beleza rude e a dor complacente de quem se atira sem remar, contrapor ou se impor, livre.
A imensidão sob meus olhos e meu corpo presente, olhos abertos, cansados, mas abertos, me é estranho que a música se encaixe tanto nas ondas como as ondas nela, sem nem um dia terem sequer ensaiado esse encontro.
Às vezes parece que em marcha rumam para a guerra, um batalhão de ondas mar à fora, mar adentro... O azul se confunde como o do céu que não se fez de todo amanhecido, com isso ainda enganando-se nos tons.
Uns barcos ao fundo, uns pássaros, algumas árvores, ou melhor, daqui vejo a copa das árvores e nada mais, várias luzes que breve se apagarão, casas, casas e mais casas com suas caixas d’águas azuis, seus restos familiares dispostos ao sol e a quem quiser ver.
Não resistiria se soubesse voar, adoraria me jogar agora daqui pra sei lá onde, contudo tendo a garantia de que iria flutuar no ar como aquele barco que vejo embaçado no meio do mar mais longe que eu vejo. Não resistiria se tivesse coragem, também, de começar a gritar. (não quero gritar, nem calar, quero estar onde estou e sentir o que sinto)
Ainda a pouco bati minha última onda contra a rocha fria a beira do meu mar, olho pra trás para ver se mais alguma caminha em minha direção, a direção da pedra, e nada.
Um tempo passou, uma coisa acabou, outras começarão, meu mar terminou.
O ar que respiro a muito não puro hoje esta perfeito pra se saborear junto à brisa da manhã. Não que eu esteja triste, ou queira morrer mais umas mil vezes como quando acordo todo dia...
Saindo do tom auto-apiedado no qual quase me deixo cair, reparo que há qualquer momento pode aparecer por lá, no meu mar, no mar que eu vejo, um enorme elefante, um rinoceronte, um dragão, qualquer coisa insólita aos seus olhos, mas que aos meus seriam pura poesia, e se eu já voasse nessa hora iria de encontro com o novo, com esse inusitado...
Mas como hoje ainda faz frio eu pretendo voltar pra cama, dormir o dia inteiro acordar à noite, me olhar no espelho e fingir que isso não aconteceu que é apenas um conto, uma crônica, um desabafo.
Enquanto esse momento não chega fico aqui contemplando a água, o mar, suas ondas, seu caminhar, seu rebentar, e o desfecho infindo de se bater a todo o momento contra a mesma rocha, no mesmo mar, o mar mais próximo que eu vejo.

domingo, 27 de setembro de 2009

Eu queria tanto que desse pra entender!! Entende?




Por onde começar quando a pessoa não sabe o qu quer expressar,até mesmo porque não se entende...
Seria mais fácil pensar em coisas que remetessem ao sentimento no momento inesplicável...
Como aquele olhar vago, sem sentimento claro, de um grande ator como Winslet;
Ou ainda aquele movimento leve do corpo solto no ar como de Pina.
Posso dizer que está nos olhos, que algo que diria com os olhos, não de tristeza, nem dor, mas com uma ponta de feliz melancolia de viver e não entendeer como as coisas se formam... átomos, junções, pura conecção matemática.
Isso, percebi, um sentimento de vazio, mas nem tanto o vazio ruim, mas um vazio de já ter estado cheio e de se esvaziar e nada, acabou. A efemeridade das coisas na vida, isso me enlouquece, tudo começa, chega ao auge e termina. Por sorte, imagina que ruim viver semrpe a mesma cena, a mesma peça, o mesmmo filme?
Mas não sei me dá uma pontinha de alguma coisa qualquer...não sei explicar, e acho que nem queero, queria mesmo era dar indícios pra que conseguissem por si só descobrir o que é isso em mim e em vocês mesmos, pois quem já não se sentiu desse jeito meio sei lá qualquer coisa assim nem tão ruim nem tão bom, sentiu e só!

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Sutileza

Tudo que se quer é um pé junto do outro,
Uma mão perto da outra,
Aquele cheiro bom que fica pelo ar,
O suave som que sopra de um belo movimento,
Tudo que queremos é a proximidade,
A parte da espera
A chegada no fim,
A expectativa do começo,
O drama do meio,
A tragédia de um possível fim,
Relacionamentos são isso,
Uma sucessão de velhos êxitos (ou não)
Um olhar,
Um abraço,
As mãos,
O beijo,
Os cheiros,
Os gestos,
Nosso sexo,
Aquelas coisas,
Nossas coisas
E tudo o que se queria...
Era que não soubéssemos que nada é pra sempre.